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Nota de Pesar Professora Claudia Forte

publicado: 28/09/2021 12h08, última modificação: 28/09/2021 15h20

 

Hoje somos chamados a encontrar palavras não para escrever projetos, artigos científicos, ou notas de aula, mas para dizer até breve para uma grande amiga, companheira, brava e grande mulher! Uma pessoa com uma luz tão brilhante, sensível, linda, inteligente, empática com os mais carentes e vulneráveis, e que insistiu em plantar em todo país, e muito especialmente, aqui na Paraíba uma sementinha de amor, indo ao socorro das escolas públicas.

 

Desejamos todos que ela tenha um bom descanso depois de tantas lutas! Fica na memória este lindo e acolhedor sorriso, da genial e multifacetada pessoa. Professora de origem no DNA, desenvolveu trabalhos voltados para a modernização dos projetos pedagógicos curriculares em São Paulo, maior centro de oportunidades de trabalho no país, preocupada com a dificuldade de colocação de jovens no mercado, com suficiente conjunto de habilidades técnicas obtidas durante a formação acadêmica, mas pouca experiência de trabalhos colaborativos em equipe, bom relacionamento interpessoal, domínio emocional, entre outros requisitos necessários para qualquer profissão.  

 

Com extensa bagagem no laboral pedagógico, não pensou duas vezes para se colocar na linha de frente para desenvolver sua tese de doutorado, com a humildade de compreender a complexidade da problemática à frente, que a fez imergir nos problemas cotidianos e multidimensionais das famílias de baixa renda e em situação de vulnerabilidade nas ‘palafitas’ da Região Metropolitana do Recife, capital do estado de Pernambuco, com graves problemas de falta de saneamento, pobreza, mortalidade infantil, e todas as suas consequências. Neste sentido, realizou um trabalho pioneiro de gerenciamento das micro finanças familiares, compreendendo profundos traços culturais e regionais, para além das visões tradicionais que raramente se preocupam com os aspectos peculiares e os trilemmas enfrentados pelas famílias ao lidar com diminutas quantias de dinheiro e suas decisões cotidianas. A tese com mais de mil e quinhentos downloads pode ser encontrada na Biblioteca da USP aqui.

 

Talvez tenha sido aí, e nos projetos subsequentes, quando ficou mais claro o papel de uma pesquisadora e seu olhar empático, mais transversal e afetivo, incluindo a utilização da sua afinidade enquanto mulher, para conhecer de perto os problemas das famílias sob uma ótica qualitativa e menos sujeita à frieza dos dados estatísticos, para analisar a realidade da maior parte das famílias chefiadas por mulheres, responsáveis pelas decisões mais importantes no lar. Para o bem comum, esse conjunto de predicados encontrou um alinhamento cósmico, no sentido de amplificar a propagação dessa energia da natureza, e levar para outras realidades a disseminação da educação financeira junto aos populares, materializado pela indicação para assumir a superintendência da Associação de Educação Financeira do Brasil (AEF-Brasil).

 

No entanto, nos idos de 2015 o país encontrava-se mergulhado em grave crise política, persistência do desemprego, surtado pela inflação de dois dígitos, quase metade da população superendividada, as maiores taxas de juros do mundo, uma desbancarização de quase um terço da população, entre outras características, que apontavam que essa missão certamente não era para qualquer equipe. Um plano perfeito precisa de um elenco à altura, quase um clã com um pacto a ser cumprido a qualquer custo, momento o qual reúnem-se um time da AEF-Brasil de mulheres brilhantes, com uma honrosa exceção, para levar adiante a missão da Estratégia Nacional de Educação Financeira (ENEF), criada em 2010.

 

Essa altura é aquela na vida que ao compreender o modus operandi do mundo, compra-se certas brigas. Momento esse que abre passagem para a entrada de uma nova personagem, a Claudia advogada, usando a sua vivência, a sua arte, poder de persuasão e sedução como executiva da AEF-Brasil, organização executora da ENEF, responsável pelas ações coordenadas pelo Conselho Nacional de Educação Financeira (CONEF), seja para produzir e impactar as pessoas em diferentes frentes pedagógicas, especialmente professores de escolas públicas, mulheres beneficiadas pelo Programa Bolsa Família e aposentados de baixa renda, sem esquecer ninguém. Sempre com fala calma e encantadora, também não pensava duas vezes se necessário fosse rugir pra cima dos executivos, quando da visão equivocada sobre o porquê de a educação financeira ter como diapasão as escolas públicas do país.

 

A Estrategista – possivelmente a partir desse caminhar, tive a muito especial oportunidade de conhece-la. Além do atento aprendizado a mim repassado por essa brilhante professora, passei a acompanhar seu lado estrategista bastante avançado, que realizou e acelerou inúmeros projetos, entre os quais a criação dos Polos de Educação Financeira, e mais tarde a Rede de Educação Financeira. Essa permitiu materializar agendas de pesquisa com a participação de pesquisadores de várias universidades distribuídas nas regiões, no formato colaborativo, orgânico e original, com ações em diferentes eixos de extensionismo, ensino e inovação, levando a educação financeira para milhares de alunos de escolas públicas no país. A pedagoga, estimulada pelos avanços digitais, coordenou o desenvolvimento de inúmeras tecnologias sociais para serem utilizadas de forma democrática e inclusiva: games, plataformas de EaD, planos de aula, videoaulas, séries de educação financeira, entre outros materiais atenciosamente produzidos para apoio aos educadores.

 

Haja vista todas as dimensões negativas provocadas pela pandemia, e a limitação a qual a mesma nos impôs, transparece com a mudança de luz, o lado idealizadora da Claudia. Esse lado vindo dela, é irmão gêmeo do lado empreendedor: eis que somos convidados a fazer parte como coautores da obra idealizada, organizada, e materializada por ela ‘Estratégia Nacional de Educação Financeira (ENEF) - Em busca de um Brasil melhor’, que pode ser encontrado aqui. Esse trabalho bastante intenso foi conjugado com outro que também nos trouxe grata satisfação de orientar como consultores as chamadas do Ministério da Educação para novas obras e livros-texto de educação financeira para o Ensino Médio. Durante esse período foi possível aprender com essa conciliadora e mediadora pessoa, na interlocução com vários coautores dos capítulos da obra e a equipe técnica de edição, para tudo fluir e ficar pronto no prazo necessário, com o máximo de qualidade possível.

 

Obstinada a quebrar barreiras, teimosa ao defender as políticas públicas concebidas sob as óticas do curto, médio e longo prazo, e não apenas como meras peças de publicidade e instrumentos midiáticos de capitalização de marcas, ainda deu um grito no mundo: lançou simultaneamente a segunda edição da obra organizada por ela em inglês e espanhol para chamar a atenção do público mais amplo possível para o Brasil, brasileiro. ‘National Strategy for Financial Education (ENEF) – Working towards a better Brazil’ e ‘Estrategia Nacional de Educación Financiera (ENEF) - En búsqueda de un Brasil mejor’, ambos produzidos em coautoria com parceiros integrantes da Rede

 

Uma pérola dos sete mares, um ser humano raríssimo. Não cabe no Lattes, não cabe nos rótulos dos executivos da Faria Lima, não cabe nos moldes de uma mulher padrão, é única, e nos apontou importantes caminhos. Impossível repetir os seus passos, mas tivemos uma bússola orientadora para esse ‘Brasil melhor’ idealizado por ela, e agradecemos profundamente esse piscar de olhos, antes da sua passagem a história. Uma mulher no Brasil não tem alternativa, a não ser, Forte. Descanse em paz, amiga.